Sofia era uma mulher autônoma. Trabalhava, estudava, tinha
tesão pela vida. E pelas pessoas. Enfim, tinha muitos momentos felizes, mesmo
dentro da prisão na qual nos acostumamos a viver.
Porém um momento em sua vida não foi muito feliz. Sofia foi estuprada
por um amigo de um colega de trabalho em uma festa. Estavam bêbados. Ela
recusou a investida. Ele a atacou. Ninguém ouviu.
Exames, B.O. e humilhação depois, Sofia descobriu que estava
grávida do desgraçado que fez aquilo com ela, mas mal sabia que a desgraçada
era ela.
Ao correr o processo, ela também, sabe-se lá por que, foi
investigada também. Desde que recomeçou a Inquisição no Brasil com o estatuto
do nascituro, as coisas andam bem feias para as heréges que tiveram o azar de
nascer com uma buceta no meio das pernas.
Pois bem, devassaram-lhe a vida, descobriram que ela vivia
quase como um homem: transava com quem queria, bebia e até gostava de
pornografia.
O estuprador foi absolvido, afinal, tratava-se de uma mulher
que ousava viver seu tesão.
Proibida de abortar, foi obrigada a ter o filho que nasceu prematuro, pois ela sempre batia na barriga com
raiva.
E culpa. O bebê não tinha culpa. Nem ela. Quem tinha?
Aguentou sozinha a gravidez. A depressão não podia ser
sanada com remédios. Os burocratas a internaram, amarraram-na na cama para que não
pudesse fazer mal ao bebê.
Finalmente, seu corpo expulsou o parasita. Ela sofria com o
ódio que tinha do bebê e com a culpa por sentir aquilo.
Não aguentou.
Assim que viu o nascituro no berço e imaginou sua vida e a
deste ser dali pra frente, pulou da janela do hospital,
com ele no colo.
Um comentário:
É exatamente o que eu faria...
Não.
Acho que eu deixava o bebê. Vai que alguém reflete que o mundo não precisava de mais um órfão, ainda mais com aquela história de vida, e meu suicídio serve pra alguma coisa?
Que nada...
No fim das contas,só iam olhar o corpo e dizer: Ah,mas também,ela era uma puta.
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