sexta-feira, 7 de junho de 2013

A Balada do Nascituro


Sofia era uma mulher autônoma. Trabalhava, estudava, tinha tesão pela vida. E pelas pessoas. Enfim, tinha muitos momentos felizes, mesmo dentro da prisão na qual nos acostumamos a viver.

Porém um momento em sua vida não foi muito feliz. Sofia foi estuprada por um amigo de um colega de trabalho em uma festa. Estavam bêbados. Ela recusou a investida. Ele a atacou. Ninguém ouviu.

Exames, B.O. e humilhação depois, Sofia descobriu que estava grávida do desgraçado que fez aquilo com ela, mas mal sabia que a desgraçada era ela.

Ao correr o processo, ela também, sabe-se lá por que, foi investigada também. Desde que recomeçou a Inquisição no Brasil com o estatuto do nascituro, as coisas andam bem feias para as heréges que tiveram o azar de nascer com uma buceta no meio das pernas.

Pois bem, devassaram-lhe a vida, descobriram que ela vivia quase como um homem: transava com quem queria, bebia e até gostava de pornografia.

O estuprador foi absolvido, afinal, tratava-se de uma mulher que ousava viver seu tesão.

Proibida de abortar, foi obrigada a ter o filho que nasceu prematuro, pois ela sempre batia na barriga com raiva. 
E culpa. O bebê não tinha culpa. Nem ela. Quem tinha?

Aguentou sozinha a gravidez. A depressão não podia ser sanada com remédios. Os burocratas a internaram, amarraram-na na cama para que não pudesse fazer mal ao bebê.

Finalmente, seu corpo expulsou o parasita. Ela sofria com o ódio que tinha do bebê e com a culpa por sentir aquilo.

Não aguentou.

Assim que viu o nascituro no berço e imaginou sua vida e a deste ser dali pra frente, pulou da janela do hospital,


com ele no colo. 

Um comentário:

Jane C. disse...

É exatamente o que eu faria...
Não.
Acho que eu deixava o bebê. Vai que alguém reflete que o mundo não precisava de mais um órfão, ainda mais com aquela história de vida, e meu suicídio serve pra alguma coisa?
Que nada...
No fim das contas,só iam olhar o corpo e dizer: Ah,mas também,ela era uma puta.